domingo, 13 de junho de 2010

A ocupação de planície durante o Bronze Final no território do Outeiro do Circo

Nos últimos anos têm sido identificados vários sítios arqueológicos num amplo território em redor do Outeiro do Circo, com especial referência para aqueles que se enquadram genericamente no IIº milénio a.C. (ANTUNES et alii, no prelo). São essencialmente sítios abertos de planície, sem qualquer preocupação defensiva, implantados em solos de boa aptidão agrícola junto a linhas de água secundárias, denotando um forte cariz agro-pecuário.

Os elementos que os compõem são sobretudo estruturas negativas (por exemplo silos e fossas), escavadas no caliço brando, revelando por vezes a convivência entre espaços ligados a actividades domésticas (armazenagem, lixeiras, etc.) e espaços funerários, comprovados pelo aparecimento de enterramentos em fossas. Podemos naturalmente supor a existência de outras estruturas, realizadas em materiais perecíveis (cabanas em madeira ou barro, paliçadas, etc.), que o registo arqueológico não preservou.

A grande quantidade de sítios arqueológicos deste tipo, detectados e intervencionados no âmbito do projecto Alqueva, sobretudo nas regiões de Beringel e Trigaches, é reveladora da intensa ocupação do fértil território dos “Barros Negros” durante a Idade do Bronze, comprovando a consolidação do sistema agro-pastoril.

Qual a sua relação com o povoamento fortificado em altura, que observamos no Outeiro do Circo?

A investigação destes contextos encontra-se ainda numa fase muito precoce, em que escasseiam os estudos de materiais e a atribuição de cronologias seguras às suas fases de ocupação, mas podemos facilmente supor que alguns destes sítios de planície, já ocupados desde o Bronze Pleno, mantiveram as suas características e funções durante o Bronze Final, sendo contemporâneos do Outeiro do Circo e naturalmente integrados na sua esfera de influência, colocando-se eventualmente sob a sua dependência.

As comunidades que habitaram o Outeiro do Circo, assumiriam a gestão de um vasto território, cuja diversidade de formas de exploração e utilização, começa a ser um pouco mais perceptível.
Os novos dados permitem vislumbrar uma verdadeira rede de povoamento hierarquizada e polarizada em torno de um sítio principal, devidamente fortificado e de enormes dimensões, que assumiria o papel de organização e controle de um vasto território que seria preenchido por diversos sítios de dimensões variáveis, situados em zonas planas, que teriam acesso directo aos recursos naturais, que explorariam. Num outro nível, será ainda de supor a existência de pequenas quintas ou granjas, de ambiente familiar, aparentadas aos povoados abertos, quer ao nível da estratégia de implantação, quer no tipo de elementos constituintes, mas de dimensão inferior, que complementariam o povoamento da região.

Falta-nos conhecer ainda outro tipo de espaços, como as necrópoles, onde foram sepultados os habitantes do Outeiro do Circo (os habitantes dos povoados abertos, enterrariam os seus mortos, preferencialmente no próprio local, como sugere o aparecimento de enterramentos em fossas), ou as vias de comunicação, aqui entendidas como caminhos naturais, por onde circulariam bens e pessoas ou os espaços rituais, que poderiam centrar-se em diversos tipos de lugares, como rios, colinas, etc.

O sítio de Arroteia 6

Dentro deste tipo de povoados abertos de planície, enquadra-se o sítio de Arroteia 6, intervencionado pela empresa de arqueologia Palimpsesto, Lda., no âmbito do acompanhamento de obras de abastecimento de água nas freguesias de Santa Vitória, Mombeja e Beringel, da responsabilidade da EMAS, EEM (fig. 1).

Fig. 1

Foi descoberto em fase de obra, através da detecção de uma fossa escavada no caliço (figs. 2 e 3), uma vez que não revelava qualquer elemento à superfície que supusesse a sua existência (tal como na maioria dos sítios semelhantes que têm sido intervencionados).


Fig. 2


Fig. 3


Implanta-se numa plataforma plana de morfologia ovalada, rodeada por pequenos cursos de água sazonais.

Dentro do grupo dos povoados abertos, este sítio assume especial importância por se situar a curta distância do Outeiro do Circo (menos de 1 Km em linha recta – fig. 4) e também por revelar uma ocupação clara do Bronze Final, conforme se comprova através da presença das taças carenadas da Fig. 5, com paralelos em estações de outras regiões, que foram datadas com maior rigor (Santos, et alii, 2008).

Fig. 4 (vermelho: Outeiro do Circo, azul: Arroteias 6)

A intervenção permitiu detectar uma única fossa, onde surgiu diverso material cerâmico (fig. 5 e 6) e um elemento de mó (dormente – fig. 7), para além de barro queimado.

Fig. 5


Fig. 6


Fig. 7

Estes indícios levam-nos a supor tratar-se de um silo, que após desactivação, serviu como fossa, sendo preenchido com diverso material até à sua completa colmatação (fig. 8).

Fig. 8

Os elementos materiais ainda se encontram em fase de estudo, para devida publicação, mas julgamos poder afirmar desde já, que os indícios detectados farão parte de um complexo habitacional de maiores dimensões que se desenvolveria por toda a plataforma, constituindo seguramente mais um povoado aberto, que se relaciona directamente com a ocupação do Outeiro do Circo, ao qual se encontraria directamente subordinado.

Bibliografia
ANTUNES, Ana Sofia, DEUS, Manuela, SOARES, António Monge, SANTOS, Filipe, ARÊZ, Luis, DEWULF, Joke, BAPTISTA, Lídia e OLIVEIRA, Lurdes (no prelo), Povoados abertos do Bronze Final no Médio Guadiana, comunicação apresentada no Encontro Sidereum Ana II, Maio de 2008.


SANTOS, Filipe J. C., AREZ; Luís, SOARES; António Monge, DEUS, Manuela de, QUEIROZ; Paula F, VALÉRIO, Pedro, RODRIGUES, Zélia, ANTUNES, Ana Sofia, ARAÚJO, Maria de Fátima (2008) O Casarão da Mesquita 3 (S. Manços, Évora): um sítio de fossas “silo” do Bronze Pleno/Final na encosta do Albardão, Revista Portuguesa de Arqueologia, vol. 11, n.º 2, pp. 55-86.

domingo, 6 de junho de 2010

Photo-interprétation à Outeiro do Circo

Le potentiel informatif des photographies aériennes est une aide précieuse dans la recherche archéologique, tant pour la détection des sites que pour l'identification et la définition des structures enfouies.

Le développement des techniques de la photographie aérienne a connu une forte impulsion pendant et après la 2ème guerre mondiale. Servant d’abord à des objectifs tactiques plus spécifiques, elle s’est rapidement répandue parmi les archéologues, principalement Britanniques, en raison des nombreuses découvertes qu´elle a permis de réaliser.

Maintenant, avec l'avènement des géoportails comme Google Earth , Bing Maps ou Flash Earth, qui permettent un accès rapide et facile aux images aériennes de n’importe quelle partie du monde, nous dénombrons de nombreuses nouvelles façons de faire de la photo-interprétation. Le développement rapide de ces technologies a été extrêmement utile pour les archéologues, car les géoportails offrent quelquefois des missions dotées d´une plus grande résolution et d´une qualité supérieure à la photographie aérienne traditionnelle. Toutefois, elle ne la remplace pas, mais plutôt la complète.

Le gisement de Outeiro do Circo n´a fait l´objet de ce type d'analyse que très récemment (SERRA et alii, 2008), ce qui a engendré d'importants changements relativement au plan antérieurement publié (PARREIRA, 1977) et a permis un calcul plus concret de la zone d´occupation, estimé à 8 ha, et maintenant jugé à environ 17 ha.

Dans le premier article portant spécifiquement sur cette importante occupation, Rui Parreira avait publié un premier plan de l'enceinte (fig. 1) qui montrait la configuration encore aujourd´hui facilement reconnaissable dans la photographie aérienne (Fig. 2), avec une forme ellipsoïdale allongée et en observant un petit morceau d´une double ceinture de muraille.


Fig. 1

Fig. 2

Un examen plus détaillé de cette image a permis la création d' un nouveau plan (Fig. 3), révélant quelques nouveautés, comme le fait que, apparemment, la double ligne des murailles s´étend tout le long de l´occupation et l'apparition d'une entrée principale marquée par de deux bastions (Fig. 3 D), en plus de l'intégration de plusieurs structures indéterminées au sommet nord de l´occupation (fig. 3 A).

Fig. 3

Au cours de l´actuel projet, nous avons recherché à exploiter de nouveau la photographie aérienne, conjuguant cette analyse avec l´information obtenue par la prospection du terrain afin de définir des domaines potentiel d'intérêt pour une future intervention. Nous avons utilisé, cette fois ci, une sélection d'images historiques de Google Earth, afin d´obtenir celle ayant le plus grand potentiel informatif (Fig. 4).

Fig. 4

Le résultat de cette petite étude a permis corriger certaines interprétations du plan précédent (erreurs de lecture dans l´observation des formes), produisant un plan plus proche de la réalité, observée aussi sur le terrain (Fig. 5 et 6) : notons cependant que la ligne double de muraille n´est pas complètement observable tout au long du périmètre défensif.

Fig. 5

Fig. 6

La zone où on a identifié la possible entrée principale de l´occupation se révèle maintenant avec plus de détails, après le traitement de l'image par accroissement du contraste (Fig. 7), facilitant la reconnaissance des formes (fig. 8). Mais l’entrée principale elle-même, dans ce cas, n'est pas observable ici en raison des ravages de l'agriculture mécanisée.

Fig. 7

Fig. 8

Les nouvelles fonctionnalités disponibles sur Google Earth, comme par exemple l´inclinaison automatique avec zoom, nous offrent de nouvelles manières de percevoir le site et ses environs, y compris l´ éventuelle création d'un support pour la réalisation de reconstructions en trois dimensions simples (Fig. 9) pour des finalités de divulgation. De telles images permettent d'emblée, une perception immédiate et intuitive de la configuration des espaces.

Fig. 9

Bibliographie:


PARREIRA, R. (1977), O povoado da Idade do Bronze do Outeiro do Circo, Arquivo de Beja, 28 – 32, pp. 31 – 45
SERRA, M., PORFÍRIO, E. e ORTIZ, R. (2008), O Bronze Final no Sul de Portugal – Um ponto de partida para o estudo do povoado do Outeiro do Circo, Actas do III Encontro de Arqueologia do Sudoeste Peninsular, Aljustrel, 26 a 28 de Outubro de 2006, VIPASCA, Arqueologia e História, n.º 2, 2ª série, 2008, pp. 163 – 170

Traduction: Isabel Casado
Révision: Gerard Chouquer