Metais da Idade do Bronze do Museu de Beja.
Carlo Bottaini (FLUC; CEAUCP-CAM), Miguel Serra, Eduardo Porfírio (Palimpsesto, Lda.; CEAUCP-CAM)
ResumoApesar da intensidade de ocupação durante toda a Idade do Bronze nesta região, atestada pelo grande número de achados e sítios arqueológicos, os artefactos metálicos revelam-se escassos, documentando uma metalurgia de pequena escala efectuada em âmbito doméstico.
No Museu Regional Rainha Dona Leonor, em Beja, encontram-se depositados diversos materiais metálicos da Idade do Bronze procedentes da zona de Santa Vitória e Ervidel, conhecidas pela presença de importantes núcleos de necrópoles de cistas.
Apresenta-se o levantamento de todo o conjunto artefactual de metais deste período, no âmbito de novo estudo que pretende uma integração mais rigorosa, quer cronológica quer espacial, na realidade cultural do Bronze do Sudoeste na região de Beja.
IntroduçãoO presente trabalho resulta da necessidade dos autores efectuarem uma revisão dos conhecimentos sobre os metais da Idade do Bronze da região Oeste de Beja, em função das investigações desenvolvidas por estes num quadro de formação académica avançada e pelos trabalhos efectuados pelos signatários no âmbito do projecto “
A transição Bronze Final / I Idade do Ferro no Sul de Portugal. O caso do Outeiro do Circo”.
Esta abordagem centra-se apenas no conjunto de peças existente no Museu Regional Rainha Dona Leonor, em Beja, mas pretende integrar os restantes elementos recolhidos nesta área geográfica.
Contextualização histórica A zona ocidental dos “
Barros Negros” é reconhecida pela presença de importantes achados e estações arqueológicas da Idade do Bronze do Sudoeste, nomeadamente as várias necrópoles de cistas do Bronze Médio que se concentram em dois importantes núcleos, a Norte, na Ribeira da Figueira e a Sul, na Ribeira do Roxo (Parreira, 1995: 132) e o imponente povoado do Outeiro do Circo com ocupação do Bronze Final (Serra et al., 2008). Neste vasto território também são conhecidos diversos achados casuísticos integráveis neste período, assumindo maior expressão a existência de diversas estelas (Barceló, 1991).
Actualmente assiste-se a um aumento exponencial de informação sobre a ocupação deste período na região, com a recente detecção de diversos povoados abertos de planície (Antunes et al., no prelo).
Os artefactos metálicos da Idade do Bronze nesta região pecam pela escassez, sendo sobretudo conhecidos pela sua associação a necrópoles.
Os primeiros metais referidos são os machados e o escopro da Mina da Juliana (Veiga, 1886: IV, 211), os dois punhais e o punção de Ervidel (Vasconcellos, 1927-29: 202) e um conjunto diversificado que inclui machados, punhais e uma ponta de dardo da região de Santa Vitória (Viana, 1944: 163, 164).
É apenas em meados do século XX que surgem os primeiros metais em contexto de escavação, na necrópole do Ulmo (Santa Vitória), onde são exumados dois punhais e um punção (Viana e Ribeiro, 1956). Um outro punhal descoberto anos mais tarde é também integrado numa necrópole (Medarra, Ervidel), apesar de se tratar de uma oferta (Ribeiro, 1966-67: 386).
A única peça proveniente do povoado do Outeiro do Circo e recolhida em prospecções corresponde a um cinzel (Parreira e Soares, 1980:115).
Na colecção do Museu Regional Dona Leonor em Beja encontram-se algumas das peças recolhidas nesta região, mas com pouca relevância quando comparadas com os restantes elementos integráveis no Bronze do Sudoeste.
É de referir ainda a presença de outras peças provenientes do Alto Alentejo, mais concretamente da região de Fronteira e que revelam o interesse de Fernando Nunes Ribeiro na Idade do Bronze de outras áreas geográficas como forma de tecer comparações com as realidades por ele documentadas mais a Sul.
Descrição do materialNo Museu Regional Rainha Dona Leonor foi possível aceder a 11 peças atribuíveis à Idade do Bronze (Tabela 1). O material não tem número de inventário atribuído, pelo que decidimos associar-lhe uma referência nossa.
O contexto de proveniência e as circunstâncias em que os achados ocorreram são, na maioria dos casos, desconhecidos: apenas
Bej_3 e
Bej_7 apresentam alguma informação a este propósito.
O grupo mais representativo é o dos machados (
Bej_1 a
Bej_6), todos eles planos, tipologia bastante comum na área de estudo. À excepção de
Bej_3, a falta de informações relativas aos contextos de procedência e às circunstâncias em que os achados ocorreram impede-nos avançar com mais detalhes.
O machado plano da Mina da Juliana –
Bej_3 – procede de uma mina de cobre onde “…
em muita profundidade fôram encontrados alguns machados e escopros de bronze, assim como calháos espheroidaes de pedra (percutores)…” (Veiga 1891: IV, 211, fig. XIII, n. 2 e 3).
Há notícia de mais dois machados planos, tipologicamente idênticos, procedentes da Mina da Juliana, sendo que um se encontra no Museu Nacional de Arqueologia (nr. Inv. 10246) enquanto que outro tem paradeiro desconhecido (Monteagudo 1977, n. 690 e 691; Bittel et al. 1969: II, 3, n. 1635).
Os metais da Mina da Juliana estão provavelmente ligados à exploração de minérios de cobre: a deposição de material metálico e/ou lítico em contextos de minas repete-se com bastante frequência, sendo este fenómeno explicável com actividades de extracção (ex. Alte, Algarve ou Quarta-Feira, Beira Alta entre outros).
O punhal
Bej_7 foi encontrado ao “…
lavrar numa courela próximo de Ervidel…”, em 1966. A peça foi oferecida a Fernando Nunes Ribeiro que teve, no ano seguinte, a possibilidade de averiguar as circunstâncias e o contexto do achado. A peça provinha de uma das sepulturas (n. 1) da necrópole de Medarra composta por um total de seis inumações em cistas. Foi a única em que apareceu metal. Fernando Nunes Ribeiro, com base na tipologia do material recolhido, atribui a necrópole ao Bronze final (1966-67: 388).
Da ponta de lança
Bej_8 nada se sabe em relação quer ao contexto quer às circunstâncias do achado.
Bej_9 e
Bej_10, apesar da falta de informações relativas ao contexto de proveniência, atendendo à tipologia e ao sítio de origem, Santa Vitória, fariam possivelmente parte de espólios de sepulturas.
Bej_9 é um punhal de cobre arsenical com dois rebites. Apresenta paralelos tipológicos com peças encontradas nalgumas sepulturas da mesma região (Bugalhos, p. ex.) (Soares 2009: 444, fig. 11, n. 4 e 5).
Bej_10 é uma ponta de dardo, em cobre arsenical (2,75 As) com folha sub-triangular percorrida por ligeira nervura central; apresenta longo espigão de secção circular na extremidade distal e quadrangular na parte proximal. Trata-se de objecto bastante raro em contextos ibéricos encontrando-se documentado quer em povoados (Outeiro de São Bernardo, Moura; Cerro dos Castelos de S. Brás, Serpa) quer em necrópoles (dólmen de La Pastora, Sevilla). Do ponto de vista tipológico, alguns autores procuram paralelos com o Mediterrâneo oriental e o Oriente Próximo (Montero Ruiz et al. 1996; Mederos Martín 2000). A ponta de dardo foi atribuída à II Idade do Bronze (Varela et al. 1986). Contudo, desconhecendo qualquer informação relativamente às circunstâncias do achado considera-se especulação avançar com a atribuição cronológica desta peça.
Finalmente, a ponta de seta
BEJ_11, tal como os machados
Bej_5 e
Bej_6, procedentes de Fronteira, excedem o território de nosso interesse.
Nota 1: Em Bittel et al. 1968 constam analisados mais dois machados planos do Museu de Beja. Todavia, a falta de número de inventário e de descrição e/ou desenhos na publicação acima referida, impede-nos a atribuição discriminada a um dos dois machados planos que se encontram no museu. Ambos apresentam prova de que lhes foi retirada amostra. As análises deram o seguinte resultado: >10 (Sn); <>10 (Sn); 0,075(Pb); 0,58 (As); 0,21 (Sb); 0,13 (Ag); 0,1 (Ni); vest. (Bi) para o nr. 2477.Conclusões1. O presente trabalho enquadra-se no âmbito do projecto “
A transição Bronze Final / I Idade do Ferro no Sul de Portugal. O caso do Outeiro do Circo”.
2. Procedemos ao levantamento de 11 artefactos metálicos atribuíveis, do ponto de vista tipológico, a diferentes períodos da Pré-História recente.
3. Grande parte do potencial informativo do material metálico por nós inventariado andou perdido: de facto, o desconhecimento das em que as peças foram encontradas e os parcos dados sobre os contextos de proveniência torna possível apenas um enquadramento de carácter eminentemente tipológico.
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